Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

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quarta-feira, 5 de setembro de 2012

É Preciso Saber Viver

No próximo mês meu filho completará 9 anos. O sonho de muitas mães verbalizado como: “Meu filho será sempre meu bebê!”, para mim é um pesadelo. Tudo o que mais desejo é que ele desabroche e deixe de ser meu bebê. A cada ano que passa muitos são os desafios; muitos problemas aparecem e algumas poucas conquistas surgem. Devo incentivá-lo a ampliar sua autonomia e confiar em suas potencialidades. Devo lhe dar amor e segurança, lhe proporcionar uma vida digna e feliz. Ofertar uma gama de sentimentos e atitudes, tendo em troca dias estafantes, beliscões, puxões de cabelo, gritos e alguns breves afagos e sorrisos. Sou cáustica como o autismo, mas tento manter a doçura amparada no calor do sol ao amanhecer e nos momentos de alegria compartilhados com meus dois amores – Otávio e meu marido. Degustar minhas cervejas prediletas enquanto vejo a satisfação de Otávio ao devorar um brigadeiro na colher em nosso boteco acolhedor. Ter um momento de tranquilidade na hora do almoço enquanto ele brinca no gramado da churrascaria em que é frequentador assíduo. Momentos prosaicos, mas que me sustentam. Sinceramente, a cada término de dia penso que não terei alegria e entusiasmo para prosseguir. Mas basta uma boa noite de sono e um novo raiar do sol, como uma página em branco, para eu retomar meus afazeres e seguir escrevendo a nossa história. Me adapto a realidade de possuir um bebê de 9 anos, que engatinha no quesito amadurecimento cognitivo, mas que avança a seu modo na compreensão do mundo que o cerca, e que se revolta com estas contradições de desenvolvimento. Posso enxergar em seus olhos a angústia e a raiva por ser assim, tão diferente e tão cofuso, mas não posso deixar de sentir a mesma angústia e raiva por ser o alvo de suas demonstrações de sofrimento. Sentir as pancadas físicas reverberadas na alma. É preciso muita garra, auto-controle e acima de tudo amor, para dar a cara a tapa, literalmente, e seguir lutando, sorrindo e amando. É preciso empenho para acreditar que a escola regular realmente o quer e aposta na sua inclusão, contemplando suas dificuldades e habilidades, e vislumbra sua permanência nos próximos anos. É preciso bom humor para enfrentar os maus momentos e auxílio para solucionar impasses. É preciso encontrar formas alternativas de ensinar, brincar, compartilhar e ser feliz. É preciso ignorar a ignorância, a arrogância e a mediocridade. É preciso saber viver com o autista e conviver com o autismo. Silvia Sperling