Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

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quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Enquanto houver sol

Sei que a preferência do clima quente não é uma unanimidade, mas tenho certeza de que a maioria das pessoas sente-se melhor com a chegada da primavera e de dias mais ensolarados, principalmente quem mora no sul do Brasil, que é o meu caso. O sol oferta sua energia e torna as tarefas mais agradáveis, afasta os maus pensamentos. Poéticamente, aquece o coração.
Se para qualquer criança o inverno e a reclusão necessária da época já é um tormento, imagine para uma criança autista, hiperativa. A chegada da primavera proporciona mais opções de lazer ao ar livre, contato com a natureza e a prática de atividades físicas como a natação, com maior freqüência. Meu filho tem o humor muito afetado no início do outono, apresentando-se muito irritado. O calor não impede que os momentos difíceis de birra ocorram, mas há possibilidades de dar vazão ao descontentamento, batendo os pés no chão, terra ou areia, gritando ao ar livre, sentindo o vento no rosto, ou mexendo na água, seja da torneira, mangueira, piscina ou mar. As roupas leves propiciam maior contato do corpo com materiais diversos, o que o agrada muito, visto que sempre busca estar de pés descalços e sem camisa.
Sempre imagino como seria positivo se pudéssemos viver em uma praia de clima quente o ano inteiro. Nada cura o autismo, mas a vida em meio à natureza, quase selvagem, diminui a pressão exercida sobre as pessoas em geral, e mais ainda sobre quem não consegue compreender plenamente as regras sociais que vão contra seus desejos. Vislumbro em várias ocasiões meu garoto guiado por seus instintos mais primitivos, querendo alimentar-se quando tem fome ou beber quando tem sede, apropriando-se do alimento sem importar a quem pertence. Este sentido da propriedade: meu e teu, deve ser ensinado e repetido frequentemente, para que situações constrangedoras não ocorram. Da mesma forma acontece com a invasão do espaço físico do outro: se a mesa que ele gosta em um restaurante estiver ocupada, Otávio simplesmente tentará retirar a pessoa do lugar, pois na sua percepção este local pertence a ele.
Esta maneira de estar no mundo, sem levar em consideração os sentimentos e desejos do outro, que é uma característica presente, em maior ou menor grau, em todos os autistas, torna mais complexa e conturbada as relações sociais em ambientes restritos. Para a aprendizagem é necessária uma delimitação de espaço proporcionando maior concentração, mas para o extravaso de energia e criatividade, nada melhor do que saborear a liberdade. Correr em meio à mata, sentar sobre um tronco de árvore, observar as formigas, ouvir atentamente os pássaros, sentir o calor do sol. Estes são prazeres que a primavera nos traz e que auxiliam o transcorrer mais sereno do dia a dia com nossas pequenas feras.

Silvia Sperling