Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

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quinta-feira, 12 de abril de 2012

A Última Romântica



Ouvindo minha rádio predileta de notícias em formato de revista eletrônica, escutei o comentário de uma colunista sobre a fantasia feminina do amor romântico, de como é ingênuo o pensamento de que encontraremos um homem amoroso, gentil, que pague as contas e que cuide dos filhos. Ela enfatizou que deveríamos diminuir as expectativas, pois jamais teremos ao nosso lado uma pessoa que supra todas nossas necessidades. Concordo, com a essência óbvia do pensamento, de que ninguém é perfeito, e nós, mais do que qualquer indivíduo, sabemos disso. Mas, discordo de que temos que desistir de procurar uma pessoa parceira para os bons e maus momentos, e que nos ame acima de tudo, pois, este é o homem ideal e ele existe sim.
A relação é posta à prova quando temos um filho especial, ainda mais no caso de uma criança autista, que nos exige de maneira extraordinária e que deixa nossos “nervos à flor da pele”. Meu marido, ao contrário do que acontece na maioria dos casos, se tornou mais presente, mais romântico, mais compreensivo e tolerante, do que antes do diagnóstico. Defeitos, ele tem muitos, mas se eu relatá-los terei que listar minha infinidade de manias e intransigências, que se somam ao longo dos anos. O que me alegra são suas atitudes: me elogia constantemente, toma café da manhã na minha companhia várias vezes por semana, almoça comigo e com o Otávio todos os dias, está presente em todas as consultas, minha e de nosso filho e, basta chamá-lo a qualquer hora que ele vem correndo. Não estou expondo isto para fazer propaganda de meu companheiro e nem para dizer: Como nossa vida de casal é maravilhosa! Brigamos muito, mas falamos tudo que pensamos, não “engolimos sapos” e temos certeza que somos felizes assim: juntos, na alegria e na tristeza.
Portanto, recomendo o contrário do que é pregado atualmente. Digo: não se contente com pouco e nem acredite em felicidade solitária, na ideia, esta sim fantasiosa, de que somos sozinhos no mundo e temos que aprender a lidar com nossos sentimentos e situações de maneira individual e onipotente. Que somos inteiros somente quando estamos sós e que se queremos achar alguém que nos complete, é porque não aprendemos a ser felizes conosco. Isto tudo é uma mentira, e considero sentimentos de quem não se arrisca a ir de encontro ao amor verdadeiro, ou que não está realmente disposto a ceder seu tempo e suas vontades, e se deixar invadir pelas minúcias do comportamento de outro.
Por que deixar de sonhar com o amor romântico, se é o sonho que nos impulsiona a ir em frente. Buscar nosso amor nos obriga a nos questionarmos e a nos tornarmos melhores e mais pacientes. E além de tudo, juntos somos mais fortes. Se um esmorece, temos outros braços para carregar nosso pesado fardo. E se uma alegria nos for proporcionada, poderemos entrelaçar nossas mãos e unir nossas bocas. Há algo mais inspirador, verdadeiro e romântico do que este momento sonhado a dois?

Silvia Sperling

sábado, 7 de abril de 2012

Debaixo de Mau Tempo

O frio está retornando à nossa região, com aquelas mudanças bruscas que todo gaúcho conhece bem, em um dia está fazendo 30graus e no outro 10graus. Assim como a temperatura oscila repentinamente, o humor de Otávio parece acompanhar esta instabilidade. A chegada do frio o irrita, ele quer permanecer sem camisa e sem meias até o limite que seu corpo aguenta. É um tira e põe de roupas que quase me enlouquece.
Em casa, principalmente nos finais de semana, suas lamúrias se arrastam e atormentam nossa audição. E da mesma forma que iniciam, se vão, sem ao menos entendermos o porquê.
Acho que pais de autistas precisam e merecem momentos de meditação e relaxamento, pois este constante estado de alerta e exigência contínua de esforço mental e físico, desestabiliza o organismo. E, se a moda é ser estressado, somos o maior exemplo do que é ser fashion, porém, desejamos loucamente estar demodê.
Por várias vezes me vejo tão acelerada, que minha cabeça dói e fico mais desastrada e irritadiça do que o normal. As horas voam quando o Otávio está em atendimentos e meu tempo parece escorrer pelos dedos. Desta forma, o desejo de introduzir a massoterapia na minha agenda nunca consegue se concretizar.
Mas, dentro de meu carro, vendo a chuva lá fora, penso: E as mães que dependem de ônibus para levar e buscar seus filhos? Assim como o tempo para elas nunca está a favor, o quanto é pesaroso aguentar o atraso do coletivo com a impaciência de um autista. E se após uma longa espera no frio, seu filho não conseguir controlar o esfíncter e urinar na roupa? Se o ônibus estiver lotado e seu filho além de molhado, tiver um ataque de fúria pela aglomeração e barulho? Meu Deus! As políticas públicas deveriam contemplar, além do atendimento aos autistas, o atendimento à família: suporte psicológico, espaços de convivência e terapias corporais, como: yoga, pilates, alongamento. Parece bobagem? Pode até ser utópico para nossa realidade brasileira, mas é algo que traria inúmeros benefícios no ambiente familiar.
Já me deparei com várias mães, com seus rostos cansados e desiludidos. E, se falamos tanto em estimulação para crianças, por que não pensar que nós, adultos, também precisamos deste estímulo para seguir em frente. Necessitamos lembrar que antes de sermos mães, somos mulheres e temos que nos sentir amadas, valorizadas e confiantes. Confiantes em nosso empenho diário e em um futuro melhor. Se não for o futuro que sonhamos quando concebemos nossos filhos, que seja um futuro mais promissor que a angústia e a ansiedade de um presente conturbado.
Suplicamos por um tempo só nosso, com risadas, aconchego e afagos: uma pitada de felicidade. Um raio de sol no meio do mau tempo.

Silvia Sperling.