Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

Bem vindo!

Aqui você encontrará histórias, emoções e sentimentos de uma mãe.
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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

INTERVALO

Dei um tempo da caneta, dos relatos, dos vídeos, da internet, enfim, do autismo. Passei por um mês difícil e por outro alentador, descobri a importância de estar cercada por profissionais competentes, valorizar o conhecimento e flexibilizar condutas. Como se afastar do tema autismo estando ele presente em todo momento de minha vida?
Na verdade me dediquei mais à observação de meu filho, de suas inconstâncias emocionais e tentei achar alternativas de uma maneira tranqüilizadora para todos nós. Tivemos que recorrer a medicamentos para minimizar sua irritabilidade e confusão mental, e eu que sempre desacreditei no efeito benéfico das drogas disponíveis me surpreendi pelo resultado positivo no seguimento da prescrição feita pela neurologista.
Não há solução mágica e definitiva para os sintomas da doença, mas temos que estar atentos ao curso da patologia: agravamento de condutas, estagnação de aprendizado, labilidade emocional, etc. E desta forma, buscar auxílio, pois é possível levar uma vida satisfatória e feliz tendo autismo e sendo familiar de autista. Assim como a troca de informações e situações entre familiares é incrivelmente terapêutica, o distanciamento e a reflexão também o são. Poder parar para avaliar o que vem sendo feito , o que foi conquistado e o que deve ser modificado é extremamente positivo e necessário. Ler romances, olhar comédias, viajar no meio da semana, rir por vários motivos, chorar sem motivo algum. Isto tudo nos fortalece.
Não tenho um filho normal e, portanto, não pretendo ter uma vida normal. Meus horários são diferentes da maioria das famílias, assim como minhas expectativas, minha rotina e meus pensamentos. Cada vez mais estou no contra fluxo: fico quando todos vão e vou quando todos ficam. Busco o sossego no meio do agito de final de ano. Quero respeitar meus sentimentos sem deixar de proporcionar lazer e momentos divertidos para meu querido.
O próximo ano nos reserva grandes desafios: a tentativa do ingresso de Otávio no ensino fundamental, o que requer sua permanência em sala de aula por um tempo maior e a realização das atividades pertinentes ao currículo da primeira série.
Que venha o futuro! Só peço que junto com as novidades venham o apoio das terapias e dos terapeutas, dos amigos e de meu amor. E que o silêncio me ajude a compreender os desejos de meu filho.

Silvia Sperling

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Enquanto houver sol

Sei que a preferência do clima quente não é uma unanimidade, mas tenho certeza de que a maioria das pessoas sente-se melhor com a chegada da primavera e de dias mais ensolarados, principalmente quem mora no sul do Brasil, que é o meu caso. O sol oferta sua energia e torna as tarefas mais agradáveis, afasta os maus pensamentos. Poéticamente, aquece o coração.
Se para qualquer criança o inverno e a reclusão necessária da época já é um tormento, imagine para uma criança autista, hiperativa. A chegada da primavera proporciona mais opções de lazer ao ar livre, contato com a natureza e a prática de atividades físicas como a natação, com maior freqüência. Meu filho tem o humor muito afetado no início do outono, apresentando-se muito irritado. O calor não impede que os momentos difíceis de birra ocorram, mas há possibilidades de dar vazão ao descontentamento, batendo os pés no chão, terra ou areia, gritando ao ar livre, sentindo o vento no rosto, ou mexendo na água, seja da torneira, mangueira, piscina ou mar. As roupas leves propiciam maior contato do corpo com materiais diversos, o que o agrada muito, visto que sempre busca estar de pés descalços e sem camisa.
Sempre imagino como seria positivo se pudéssemos viver em uma praia de clima quente o ano inteiro. Nada cura o autismo, mas a vida em meio à natureza, quase selvagem, diminui a pressão exercida sobre as pessoas em geral, e mais ainda sobre quem não consegue compreender plenamente as regras sociais que vão contra seus desejos. Vislumbro em várias ocasiões meu garoto guiado por seus instintos mais primitivos, querendo alimentar-se quando tem fome ou beber quando tem sede, apropriando-se do alimento sem importar a quem pertence. Este sentido da propriedade: meu e teu, deve ser ensinado e repetido frequentemente, para que situações constrangedoras não ocorram. Da mesma forma acontece com a invasão do espaço físico do outro: se a mesa que ele gosta em um restaurante estiver ocupada, Otávio simplesmente tentará retirar a pessoa do lugar, pois na sua percepção este local pertence a ele.
Esta maneira de estar no mundo, sem levar em consideração os sentimentos e desejos do outro, que é uma característica presente, em maior ou menor grau, em todos os autistas, torna mais complexa e conturbada as relações sociais em ambientes restritos. Para a aprendizagem é necessária uma delimitação de espaço proporcionando maior concentração, mas para o extravaso de energia e criatividade, nada melhor do que saborear a liberdade. Correr em meio à mata, sentar sobre um tronco de árvore, observar as formigas, ouvir atentamente os pássaros, sentir o calor do sol. Estes são prazeres que a primavera nos traz e que auxiliam o transcorrer mais sereno do dia a dia com nossas pequenas feras.

Silvia Sperling

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Pés Descalços


Tenho um cansaço crônico, profundo, imenso. Meus pés e pernas doem constantemente, assim como sinto um desconforto cervical e lombar. Às vezes penso como gostaria de deitar e dormir profundamente sem pensar no relógio que está sempre por perto me mostrando que a próxima tarefa está próxima de iniciar. Este relato pode induzir quem lê a imaginar que sou uma pessoa preguiçosa e sedentária, mas pasmem, este é o sentimento de uma pessoa super ativa e quase maníaca. Levo meu filho à escola e faço ginástica no mínimo 3 vezes por semana, vou ao supermercado, busco ele na escola, vou à manicure 1 vez por semana, passo roupa todos os dias para não acumular, organizo meu apartamento de 2 andares sempre antes de sair revisando cada cômodo, inclusive guardando os inúmeros objetos atirados pelo Otávio. Organizo as mochilas dele (escola, clínica, natação) na noite anterior, dou banho, planejo as refeições, levo ao banheiro, atento para ele estar sempre limpinho e arrumado. E assim o dia vai passando, e meu corpo e mente se esgotam.
Imagino como seria bom não ser escrava de horários e compromissos tão repetitivos. Olhar um filme ou ler até tarde, sabendo que meu sono não seria interrompido e que nos finais de semana e feriados poderia dormir um pouco mais. Estar em um restaurante sem pressa de terminar a refeição. Poder chegar atrasada à escola para buscar meu filho e ele ainda reclamar que cheguei muito cedo. Programar passeios à praças sem me preocupar com o trânsito em torno, podendo sentar sossegada em um banco enquanto Otávio brincaria com outras crianças. Não me preocupar se ele está com vontade de ir ao banheiro, se está ficando com fome, cansado ou irritado. Simplesmente não me preocupar...
Otávio voltou a ficar bravo quando chega em casa, o que fazia quando tinha uns 2 anos e meio, no período em que foi feito o diagnóstico. Chega chorando, gritando e batendo pé. Transcorre um tempo e a raiva passa. Mas meu cansaço persiste.
Não sou triste. Não sou pessimista, nem alarmista. Mas gosto de expor a realidade como ela é. Esta é a vida de uma mãe de autista, seja pobre ou rica, casada ou solteira, dona de casa, empregada ou patroa. A jornada é árdua, requer condicionamento físico, saúde mental e apoio emocional.
Ainda bem que após a noite que acalenta sonhos e repousa o corpo em algumas horas de sono reparador, o novo dia traz a dose necessária de energia e esperança para o recomeço.

Silvia Sperling

domingo, 7 de agosto de 2011

Pequenas Grandes Alegrias

Enquanto esperamos ansiosos os avanços da medicina no tratamento do autismo, como medicações específicas para a síndrome e neuroestimuladores úteis para o melhor desempenho do cérebro humano, acredito que o melhor remédio atual é a oferta de atendimentos especializados, isto inclui terapia comportamental, atividade física, musicoterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e outras técnicas que proporcionem bem – estar e aquisição de ferramentas necessárias ao desenvolvimento das habilidades precárias no indivíduo com autismo.
Muitas vezes nós, pais, nos desanimamos pelo retorno lento e diminuto que obtemos com tanto investimento de tempo e dinheiro, mas é assim mesmo, devagar e sempre. Se nos abstermos de analisar qual metodologia específica empregada desde o primórdio dos tratamentos comportamentais é o mais eficaz, veremos que todos os métodos têm em comum a repetição de atividades da vida diária e de ensinamento de atitudes sociais adequadas, associada ao convívio próximo com o outro (seja a mãe, o pai, o cuidador, outras crianças,...). Desta maneira emergem a personalidade, o interesse em aprender e viver em sociedade e o prazer da descoberta de novas possibilidades de ser e estar neste mundo.
Meu filho somente agora, com 7 anos, consegue compreender situações mais complexas expressando características como o deboche e a satisfação e insatisfação. Também, recentemente , começou a desenvolver o simbolismo, empurrando uma boneca em um carrinho de criança e oferecendo comida a ela. É claro que na maioria das vezes utiliza seus brinquedos de forma esteriotipada, mas as conquistas referidas anteriormente me deixam muito feliz e tranqüila para liberá-lo em casa para estes momentos de “descarrego”.
Outra consideração que faço é sobre a importância que a rotina de atividades exerce sobre as pessoas com autismo. Ela é tranqüilizadora, e na medida que não “engessa” o indivíduo, ela deve ser mantida, visto a mudança comportamental que ocorre no período de férias escolares, por exemplo. O Otávio mostra-se alegre com as férias, mas ansioso, exacerbando os maneirismos e aumentando os momentos de choramingos e resmungos. Tento preencher o vácuo dos turnos da escola regular com atividades prazerosas como a natação e a ginástica olímpica, bem como, passeios à praças, cinema e viagens. É cansativo, mas uma nova rotina de férias é estabelecida e o comportamento e o humor vão se estabilizando.
De volta ao período escolar, Otávio está se mostrando muito confiante em sua turma e acompanhando as propostas de forma adaptada e com auxílio de sua assistente individual.
Concluo, que a organização exterior é primordial para a organização interna dos indivíduos com autismo, sendo necessário o estabelecimento de rotinas que mesclem o lúdico com o trabalho cognitivo, desta forma, colheremos os frutos da dedicação física e emocional.

Silvia Sperling

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Santa Paciência

A tolerância às frustrações é algo muito individual e nós, mães de autistas, somos submetidas a inúmeras e crescentes provas de resistência física, de paciência e de humor.
Eu, particularmente, me desestabilizo muito com a redução de horas de sono, com a bagunça exagerada e com a dificuldade de meu filho aprender a ir ao banheiro sozinho quando necessita. A soma destes fatores de forma contínua me leva à ataques de fúria e gritos, e a incompreensão de quem me cerca retrucando: “Por que ser tão grosseira e obsessiva?”, me deixa mais irada e desanimada. Mas será que tenho que me acostumar e achar agradável acordar às 4h da manhã no inverno quando a maioria das pessoas está curtindo o sono profundo? Ou acordar às 6h no final de semana, em que 99% dos humanos que estão de folga, “recarregam suas baterias” descansando o corpo e a mente até mais tarde? E o caos? Devo achar normal não conseguir caminhar pelo quarto de meu filho, que joga todos seus brinquedos no chão e ali os deixa até eu guardá-los pela vigésima vez no dia, ou me contento com a parcial arrumação à sua maneira, jogando alguns itens no armário?
Quando penso que muitos momentos difíceis ficarão para trás, logo, outros tão complicados aparecem. Tenho que reaprender a lidar com ataques de raiva de Otávio em público. Hoje ele é maior, mais forte e determinado. Me arrasta, me enfrenta, me desgasta, me diminui com seus gritos em corredores movimentados do shopping. Sinto os olhos das pessoas nos observando, rostos colados nas vitrines, parece que revejo filmes sobre crianças autistas. Sinto um calor e uma tristeza profunda. Odeio o sentimento de pena que sei que os outros estão sentindo.
Onde estão a garra e determinação referidas e admiradas por quem conhece nossa história? Será uma máscara que carrego, de forte e batalhadora, que enfrenta tranquilamente esta guerra contra o autismo? Não. Sou humana e como toda mãe de autista, tenho meus sentimentos aflorados pela avalanche de sintomas expostos pela doença de meu filho.
Vivemos num carrossel de emoções oriundas de um dia a dia nada típico da sonhada vida em família. A complexidade do autismo nos modifica sempre e para sempre.

Silvia Sperling.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

O menino sem idade

Olho seu rosto diariamente. Seus olhos cheios de vida, seu sorriso inocente, suas belas e delicadas feições juntamente com seu comportamento pueril, me fazem esquecer o passar dos anos. Penso no tempo quando me sinto cansada e me olho no espelho, ou quando vejo seus antigos colegas cursando a segunda série e me recordo que ele ainda está na educação infantil. No ócio as horas se arrastam com seus rituais cíclicos, do perambular pelos dormitórios ao bater em objetos ou girá-los, o acender e apagar de luzes, o pular, sentar e levantar. Não posso ser injusta ignorando o desabrochar da maturidade de meu filho, sua companhia interessada nas nossas atividades familiares e a descoberta do prazer de estar junto, seu esforço em se fazer entender e compreender nossas intenções. Mas todas aquisições vêm devagarinho, na contramão da rapidez que vejo lá fora, do outro lado de minha janela. Acho que é por isso que cultuo minha casa como um templo, onde o ritmo que impera é o dele. Seus horários de acordar, almoçar, jantar e dormir, e até mesmo o respeito à suas noites em claro, onde tento buscar o silêncio como aliado a meus sonhos de passado e de futuro. O presente, quase sempre, quero esquecer.
O tempo não é mais meu, é dele. A idade sim, é minha. Nossos anos se somam, pois empresto minha vida à ele. Parece trágico mas não precisa ser, construo um caminho diferente, invento outro modo de ver e outro relógio para nos guiar. Este é o nosso tempo, esta é a nossa vida.

Silvia Sperling

quarta-feira, 8 de junho de 2011

ORGULHO DE SER AUTISTA

Depois do dia 2 de abril, o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, temos mais uma oportunidade para falarmos sobre a doença no dia 18 de junho, o Dia do Orgulho Autista. Mas por que a data alusiva ao orgulho? Orgulho de quê? Muitos sustentam a bandeira de que é necessário promover a diversidade e que o autista é somente uma pessoa que compreende o mundo de uma forma distinta da maioria, e que portanto não

se deve procurar a cura pois não é uma doença e sim um modo de ser.
É claro que lutamos por um mundo mais tolerante com as formas físicas e intelectuais, e que o convívio com o diferente sempre enriquece. É verdade também que o autista nos faz enxergar além do que nos habituamos e fomos criados para atentar, e nos obriga a pensar modos alternativos de viver. Mas temos que lembrar que as características do espectro autista estão presentes em uma parcela significativa da população e abrange desde pessoas com traços leves, que não comprometem seu desenvolvimento físico e mental, e consequentemente a inserção escolar e no mercado de trabalho, até casos de regressão ou interrupção na evolução normal da criança, ocasionando formas de autismo moderado a severo, com prejuízos importantes na linguagem, compreensão, comportamento e autonomia.
Como o pai ou mãe de um portador de autismo moderado ou severo pode concordar com a idéia de que seu filho não é doente e portanto não necessita ser curado?
Temos que nos orgulhar sim, de nossos pesquisadores que buscam incessantemente as causas biológicas do autismo e que desta forma poderão desenvolver medicamentos e terapias eficazes na regressão dos sintomas incapacitantes desta patologia.
Temos que nos orgulhar também da crescente divulgação sobre o autismo e a desmistificação dos autistas. Da batalha por inclusão em escolas regulares com profissionais qualificados e convívio social normal.
E por fim, temos que aproveitar a data para nos orgulharmos de nossos filhos, familiares e amigos autistas: únicos e corajosos, que desafiam nosso entendimento e cativam nossa admiração, superando as barreiras impostas pela doença, fazendo emergir o autista e imergir o autismo.

Silvia Sperling.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Ser Mãe

SER MÃE
Quando uma mulher torna-se mãe ela é inundada por sentimentos de onipotência e de esperança, como se ela fosse poderosa o suficiente para gerar uma pessoa perfeita: feliz e saudável, e com qualidades que ela julga necessárias a uma vida plena, como a beleza, a inteligência, astúcia e o carisma. A mãe vê famílias vendendo a imagem de realização, meninos espertos que são craques no futebol e mais hábeis na tecnologia do que os próprios pais, e meninas aptas a conquistar a admiração necessária ao sucesso, seja pelos atributos físicos ou pelo desempenho intelectual.
Assim sendo conduzidas nossas expectativas não nos preparamos para a espera da imperfeição. O que fazer quando um filho nasce e cresce de modo distinto à estas exigências da sociedade?
Meu filho me trouxe esta reflexão. Quando nasceu há sete anos sendo um menino bonito e esperto, e apresentando grande destreza motora durante seu crescimento, jamais imaginei ter que lidar com uma deficiência. Mas ela estava presente ali silenciosa. Assim é o autismo, uma doença neurológica sorrateira, que mostra sua face perversa geralmente após o segundo ano de vida da criança. Até este período ou os sintomas são muito tênues, quase imperceptíveis ou realmente nada diferente é apresentado.
Assim, com a descoberta da doença de meu pequeno, tive que aprender a encarar noites de insônia, ataques de birra, manias alimentares, esteriotipias motoras e uma gama de surpresas desagradáveis que o autismo traz consigo. Tive que desconstruir a idéia de perfeição e adequação para a partir daí descobrir o real significado de ser mãe. Ser mãe é acolher uma pessoa diferente em características físicas e emocionais de nós, compreender estas diferenças e amá-la mais do que a si própria. Ser mãe é dar condições desta pessoa desenvolver-se plenamente, dentro de suas capacidades sem criar expectativas de sucesso e glória. Ser mãe é descobrir que nos tornaremos poderosas sim, não a ponto de comandar o destino, mas para desbravar as adversidades e incorreções que a vida nos ofertar, pois basta a conquista de um abraço e um sorriso de nossos filhos para sermos invencíveis.
Silvia Sperling.

Autismo.wmv

segunda-feira, 28 de março de 2011

Sobre o tempo

Cinco anos se passaram desde o diagnóstico de meu filho. Há cinco anos atrás eu me desesperava e sentia um buraco abrir-se dentro de mim, uma dor única que sou incapaz de traduzir, só sei que aquele sentimento era um misto de medo e tristeza profunda. A revolta deu lugar à luta e após outros períodos angustiantes na evolução da doença, que exigiram paciência e persistência no tratamento eleito, hoje, saboreio momentos mais felizes. A felicidade, este sentimento que parecia ter me abandonado no momento do diagnóstico do autismo, voltou a acalentar meu coração. Sintp-me feliz ao ver meu filho feliz quando nos acompanha nos passeios de final de semana, na rotina do dia adia, nas viagens de avião, nos banhos de mar e de piscina, na chegada e saída da escola, na prática da atividade física e no convívio com os demais. Sinto-me feliz de poder cuidar de mim, de freqüentar a academia, de ir ao salão de beleza, de ler, de olhar televisão, sair para jantar, tomar uma cerveja e viajar com meu marido. Sinto-me feliz por ter este marido companheiro que é um pai extraordinário, que leva e busca o filho da escola, que vai a todas as consultas pediátricas e estuda a noite inteira o que é up date na literatura médica sobre o autismo. Só não gosta de ir à parques e tomar sol, mas daí já seria pedir demais...
Se consegui resgatar a alegria de viver e o prazer de pequenos momentos acho que já sou vitoriosa. Hoje posso dizer que a vida vale a pena mesmo com traçados tão estranhos a nossos olhos e repertórios tão distintos de nossos sonhos infantis.
Portanto, sofra somente quando for inevitável e reserve um lugar no seu coração para a alegria reencontrar a sua morada e te devolver a paz.

Silvia Sperling.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Dia Azul

Dia 02 de abril está chegando, esta data já está consagrada em vários lugares do mundo como o Dia de Conscientização do Autismo. Há caminhadas, palestras e mobilizações diversas para chamar a atenção da população para o problema e se discutir a situação de milhares de pessoas acometidas por esta síndrome. Prédios e monumentos são iluminados de azul como forma de expressão, para que se pare e reflita sobre o tema. O que estamos fazendo por nossos autistas? Como os estamos tratando?
Meu filho progride a cada mês e ano, a seu ritmo, mas de maneira feliz e com o suporte de todos atendimentos que se fazem necessários. Tem uma vida social ativa e neste verão fez sua primeira viagem de avião, experiência esta que tanto apreciou, que se repetiu mais duas vezes nas mesmas férias. Curtiu um resort com infraestrutura completa que acolhe suas necessidades de lazer e tranquilidade, e manias gastronômicas. Com todas estas vivências qualquer ser humano se desenvolve e potencializa suas habilidades, mas como um portador de necessidade especial que não tem acesso à terapias e convívio social normal pode desabrochar e sentir-se parte da sociedade? Se lhe é privada a educação, a relação com o outro e o convívio com as regras sociais, por ignorância do cuidador ou do Estado, o prognóstico é quase fatal: a marginalização do indivíduo e a perda da identidade de um ser único.
Temos que dar voz aos autistas não-verbais e auxiliar à compreensão dos que podem falar mas
não conseguem se fazer entender, pois o modo de enxergar o mundo pelo autista é quase irreal para nós, e se somos uma espécie dita evoluída, temos que aceitar o diferente e aprender com ele.
Está mais do que na hora de mobilizarmos nossa região , carente de iniciativas frutíferas nesta área, o que deixa inúmeros pais à mercê da sorte no tratamento de seus filhos ( a sorte de encontrar bons profissionais, boas escolas,de poder custear a estrutura necessária).
Vamos nos juntar a esta luta e fazer com que o dia 2 de abril de 2011 seja colorido de azul em vitrines, roupas, prédios, e que esta data entre no calendário de Porto Alegre e marque o
início de um novo tempo. Tempo de conhecimento, compreensão e ação em prol de nossos autistas.

Silvia Sperling.