Autismo - Uma Vida em Poucas Palavras

Bem vindo!
Aqui você encontrará histórias, emoções e sentimentos de uma mãe.
Bem vindos!
segunda-feira, 25 de junho de 2012
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Tuas Palavras Silenciosas
Como é viver num mundo sem palavras? Num mundo de gemidos, gritos, uivos, lamúrias e melodias. O surdo-mudo não expressa oralmente o que pensa, mas se comunica através da escrita e da linguagem gestual, o que o conecta facilmente com nosso mundo cheio de expressões significantes. Com o surdo-mudo podemos trocar informações e sentimentos, há o caminho dos sinais que fazem a ponte entre dois seres. Mas, no autista não-verbal, encontrar este canal de comunicação é muito mais árduo e por vezes, inalcançável. Recorremos ao olhar, ao comportamento, às expressões faciais. Temos que ensinar constantemente a eles que nos mostrem o que querem, mas muitas vezes, nem eles sabem o que desejam. Será a confusão mental da doença ou nossa ignorância em relação aos seus desejos?
Meu filho compreende grande parte do que é dito a ele, pois o que lhe é solicitado é feito, mas o resto do que lhe é revelado: nossos sentimentos, alegrias, tristezas, será que é compreendido? Esta é uma dúvida e uma agonia. Qual o alcance de nossas palavras no mundo do autista que não fala? “Senta aqui”, é um comando entendido, assim como em um adestramento de outros seres vivos, mas a frase “Eu te amo!”, como é recebida e decodificada? É certo que nossos atos “falam”, portanto, nossa frase recheada de sorrisos, abraços e beijos, significam muito, trazem conforto e aconchego, dispensando explicações. Mas sempre estaremos em dúvida de como nossas ações e palavras são interpretadas.
Os olhos de Otávio são repletos de emoção e significado, muitas vezes parecem transbordar sentimentos e não é raro ouvir de outras pessoas que ele “fala com os olhos”. É verdade que seu mundo interior transparece através da utilização de seu corpo como instrumento de comunicação, e repleta o ambiente vazio.
Ele existe, pensa, sofre e comemora em seu mundo de imagens e sons, sem acesso a esta gama de palavras que enchem minha cabeça e preenche linhas e mais linhas de escritos. Esforço-me para quando estamos a sós, comunicar-lhe o que estou fazendo e o que farei em seguida. Questiono-lhe a todo momento sobre como está se sentindo, recebendo, muitas vezes, um sorriso ou um resmungo e até, algumas vezes, uma pequena palavra inesperada, como: bem, bom. No entanto, nossa luta diária busca encontrar o caminho que acesse este espaço de pensamentos e sua conversão em palavras faladas e escritas, que nos aproxima dos outros, agrega e tranquiliza.
Enquanto este dia não chega, recheio os dias de meu pequenino silencioso com estímulos, sensações e vivências. E preencho o meu tempo com leituras, conversas, risadas, choros e sonhos. Sonhos de que um dia o sofrimento e a alegria de Otávio possam ser traduzidos em palavras, e a frase “Eu te amo!”, tenha sua real dimensão compreendida.
Silvia Sperling
domingo, 6 de maio de 2012
AMOR DE MÃE
Estou lendo a surpreendente história de Eliana Zagui, a jovem de 38 anos que desde os 2 anos de idade mora no Hospital das Clínicas de São Paulo, por conta da poliomielite. Sua trajetória é dura, massacrante, solitária, porém, ela, a protagonista, se mantém leve e batalhadora, encontrando conforto e força em amigos que foram entrando em sua vida. Uns apenas passaram, e outros, poucos, permanecem a iluminar seu caminho até hoje.
Algo que me chocou muito no seu relato é a quantidade de crianças que foram abandonadas no hospital por seus pais após o diagnóstico de enfermidades severas que as impediram de levar uma vida normal. Tanto crianças muito pequenas, quanto as maiores, que já tinham muitas histórias em família e um grande apego com irmãos e pais, após o acometimento de uma doença de devastação física ou neurológica, ou ainda, após um acidente que deixa sequelas irreversíveis, em sua maioria, são apagadas da estrutura familiar como se tivessem morrido.
Como pode uma mãe se desligar de um filho da noite para o dia, principalmente no momento que ele mais precisa de apoio, carinho e dedicação?
Eu penso que tenho o direito de fazer muitas coisas que me deixam feliz e que me trazem tranquilidade, mas acredito que hoje não tenho o direito de fazer tudo o que gostaria, por ter um filho especial que necessita de muito mais cuidados e disponibilidade de tempo de minha parte do que dispenderia com um filho “normal”.
Quando nasce um filho, a mulher deve despir-se de seus antigos papéis e assumir o maior e mais importante deles, que requer abnegação e entusiasmo. Isto é ser mãe. Fazer de seu tempo e sua vida um reflexo de seu filho.
Se estes sentimentos de entrega e responsabilidade com o outro não são despertados na mulher após o nascimento de uma criança, ali não nasceu uma mãe e desta pessoa não podemos esperar as atitudes de proteção e amor soberano. É cruel, mas há mulheres que simplesmente não se sentem mães e mesmo assim colocam filhos no mundo, como se esta fosse a ordem natural da vida: procriar como bichos. Mas não o somos totalmente. Somos seres muito mais complexos e que dependemos de outro ser por um breve período, e algumas vezes, para o resto da vida.
Se a decisão de ter um filho fosse realmente pensada e amparada por sentimentos verdadeiramente altruístas, penso que casos como o de Eliana teriam outro percurso, menos nebuloso.
Nós, mães, não temos o poder de afastar as mazelas do mundo de nossos rebentos (Bem que gostaríamos!), mas temos o dever de mover montanhas para tornar sua dor mais fugaz ou suportável.
Gerar um filho é o comprometimento com duas vidas para o resto de nosso tempo. Parece exagero, mas é amor de mãe: profundo, intenso e eterno.
Silvia Sperling
quinta-feira, 12 de abril de 2012
A Última Romântica
Ouvindo minha rádio predileta de notícias em formato de revista eletrônica, escutei o comentário de uma colunista sobre a fantasia feminina do amor romântico, de como é ingênuo o pensamento de que encontraremos um homem amoroso, gentil, que pague as contas e que cuide dos filhos. Ela enfatizou que deveríamos diminuir as expectativas, pois jamais teremos ao nosso lado uma pessoa que supra todas nossas necessidades. Concordo, com a essência óbvia do pensamento, de que ninguém é perfeito, e nós, mais do que qualquer indivíduo, sabemos disso. Mas, discordo de que temos que desistir de procurar uma pessoa parceira para os bons e maus momentos, e que nos ame acima de tudo, pois, este é o homem ideal e ele existe sim.
A relação é posta à prova quando temos um filho especial, ainda mais no caso de uma criança autista, que nos exige de maneira extraordinária e que deixa nossos “nervos à flor da pele”. Meu marido, ao contrário do que acontece na maioria dos casos, se tornou mais presente, mais romântico, mais compreensivo e tolerante, do que antes do diagnóstico. Defeitos, ele tem muitos, mas se eu relatá-los terei que listar minha infinidade de manias e intransigências, que se somam ao longo dos anos. O que me alegra são suas atitudes: me elogia constantemente, toma café da manhã na minha companhia várias vezes por semana, almoça comigo e com o Otávio todos os dias, está presente em todas as consultas, minha e de nosso filho e, basta chamá-lo a qualquer hora que ele vem correndo. Não estou expondo isto para fazer propaganda de meu companheiro e nem para dizer: Como nossa vida de casal é maravilhosa! Brigamos muito, mas falamos tudo que pensamos, não “engolimos sapos” e temos certeza que somos felizes assim: juntos, na alegria e na tristeza.
Portanto, recomendo o contrário do que é pregado atualmente. Digo: não se contente com pouco e nem acredite em felicidade solitária, na ideia, esta sim fantasiosa, de que somos sozinhos no mundo e temos que aprender a lidar com nossos sentimentos e situações de maneira individual e onipotente. Que somos inteiros somente quando estamos sós e que se queremos achar alguém que nos complete, é porque não aprendemos a ser felizes conosco. Isto tudo é uma mentira, e considero sentimentos de quem não se arrisca a ir de encontro ao amor verdadeiro, ou que não está realmente disposto a ceder seu tempo e suas vontades, e se deixar invadir pelas minúcias do comportamento de outro.
Por que deixar de sonhar com o amor romântico, se é o sonho que nos impulsiona a ir em frente. Buscar nosso amor nos obriga a nos questionarmos e a nos tornarmos melhores e mais pacientes. E além de tudo, juntos somos mais fortes. Se um esmorece, temos outros braços para carregar nosso pesado fardo. E se uma alegria nos for proporcionada, poderemos entrelaçar nossas mãos e unir nossas bocas. Há algo mais inspirador, verdadeiro e romântico do que este momento sonhado a dois?
Silvia Sperling
sábado, 7 de abril de 2012
Debaixo de Mau Tempo
O frio está retornando à nossa região, com aquelas mudanças bruscas que todo gaúcho conhece bem, em um dia está fazendo 30graus e no outro 10graus. Assim como a temperatura oscila repentinamente, o humor de Otávio parece acompanhar esta instabilidade. A chegada do frio o irrita, ele quer permanecer sem camisa e sem meias até o limite que seu corpo aguenta. É um tira e põe de roupas que quase me enlouquece.
Em casa, principalmente nos finais de semana, suas lamúrias se arrastam e atormentam nossa audição. E da mesma forma que iniciam, se vão, sem ao menos entendermos o porquê.
Acho que pais de autistas precisam e merecem momentos de meditação e relaxamento, pois este constante estado de alerta e exigência contínua de esforço mental e físico, desestabiliza o organismo. E, se a moda é ser estressado, somos o maior exemplo do que é ser fashion, porém, desejamos loucamente estar demodê.
Por várias vezes me vejo tão acelerada, que minha cabeça dói e fico mais desastrada e irritadiça do que o normal. As horas voam quando o Otávio está em atendimentos e meu tempo parece escorrer pelos dedos. Desta forma, o desejo de introduzir a massoterapia na minha agenda nunca consegue se concretizar.
Mas, dentro de meu carro, vendo a chuva lá fora, penso: E as mães que dependem de ônibus para levar e buscar seus filhos? Assim como o tempo para elas nunca está a favor, o quanto é pesaroso aguentar o atraso do coletivo com a impaciência de um autista. E se após uma longa espera no frio, seu filho não conseguir controlar o esfíncter e urinar na roupa? Se o ônibus estiver lotado e seu filho além de molhado, tiver um ataque de fúria pela aglomeração e barulho? Meu Deus! As políticas públicas deveriam contemplar, além do atendimento aos autistas, o atendimento à família: suporte psicológico, espaços de convivência e terapias corporais, como: yoga, pilates, alongamento. Parece bobagem? Pode até ser utópico para nossa realidade brasileira, mas é algo que traria inúmeros benefícios no ambiente familiar.
Já me deparei com várias mães, com seus rostos cansados e desiludidos. E, se falamos tanto em estimulação para crianças, por que não pensar que nós, adultos, também precisamos deste estímulo para seguir em frente. Necessitamos lembrar que antes de sermos mães, somos mulheres e temos que nos sentir amadas, valorizadas e confiantes. Confiantes em nosso empenho diário e em um futuro melhor. Se não for o futuro que sonhamos quando concebemos nossos filhos, que seja um futuro mais promissor que a angústia e a ansiedade de um presente conturbado.
Suplicamos por um tempo só nosso, com risadas, aconchego e afagos: uma pitada de felicidade. Um raio de sol no meio do mau tempo.
Silvia Sperling.
Em casa, principalmente nos finais de semana, suas lamúrias se arrastam e atormentam nossa audição. E da mesma forma que iniciam, se vão, sem ao menos entendermos o porquê.
Acho que pais de autistas precisam e merecem momentos de meditação e relaxamento, pois este constante estado de alerta e exigência contínua de esforço mental e físico, desestabiliza o organismo. E, se a moda é ser estressado, somos o maior exemplo do que é ser fashion, porém, desejamos loucamente estar demodê.
Por várias vezes me vejo tão acelerada, que minha cabeça dói e fico mais desastrada e irritadiça do que o normal. As horas voam quando o Otávio está em atendimentos e meu tempo parece escorrer pelos dedos. Desta forma, o desejo de introduzir a massoterapia na minha agenda nunca consegue se concretizar.
Mas, dentro de meu carro, vendo a chuva lá fora, penso: E as mães que dependem de ônibus para levar e buscar seus filhos? Assim como o tempo para elas nunca está a favor, o quanto é pesaroso aguentar o atraso do coletivo com a impaciência de um autista. E se após uma longa espera no frio, seu filho não conseguir controlar o esfíncter e urinar na roupa? Se o ônibus estiver lotado e seu filho além de molhado, tiver um ataque de fúria pela aglomeração e barulho? Meu Deus! As políticas públicas deveriam contemplar, além do atendimento aos autistas, o atendimento à família: suporte psicológico, espaços de convivência e terapias corporais, como: yoga, pilates, alongamento. Parece bobagem? Pode até ser utópico para nossa realidade brasileira, mas é algo que traria inúmeros benefícios no ambiente familiar.
Já me deparei com várias mães, com seus rostos cansados e desiludidos. E, se falamos tanto em estimulação para crianças, por que não pensar que nós, adultos, também precisamos deste estímulo para seguir em frente. Necessitamos lembrar que antes de sermos mães, somos mulheres e temos que nos sentir amadas, valorizadas e confiantes. Confiantes em nosso empenho diário e em um futuro melhor. Se não for o futuro que sonhamos quando concebemos nossos filhos, que seja um futuro mais promissor que a angústia e a ansiedade de um presente conturbado.
Suplicamos por um tempo só nosso, com risadas, aconchego e afagos: uma pitada de felicidade. Um raio de sol no meio do mau tempo.
Silvia Sperling.
quinta-feira, 5 de abril de 2012
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